terça-feira, 11 de agosto de 2009

O Que Vem de Longe


O que vem de longe, é meu interior pungente. Como ele sai das tuas palavras e molha tua boca vermelha de existir exuberante é coisa que não sei. Mas desconfio. Talvez seja um fio de desejo Éros e Psikhé, sibilante em meu peito. Mas se mais do que isso for, ah, que satisfação sem nome! É a indizível experiência do improvável. Como a folha da árvore que cai, delicada e precisa, sobre mim, num pretenso acaso. Mas os acasos e os destinos estão além do que minha natureza imediata pode compreender. Claudicante, tento acompanhar este meu que está em você, sem você saber, e sem tentar roubá-lo de ti. Sei que você veio de longe, mas desde o início dos tempos há coisas nossas que estão uma com o outro, e que cuidamos delas como se fossem nossas, antes mesmo de nos conhecer; E são.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Vago Alarme



Um vagalume à noite, sendo lentamente devorado pela aranha, pisca como se pedisse socorro a quem passar pelo caminho. E a luz, que era vigorosa há horas atrás, ainda fraqueja, intermitente, para todos, para ninguém. A aranha se banqueteia, esse jantar iluminado...

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Do Silêncio


1. Moldando-se:



"Aos que silenciam falta-lhes quase sempre finura e cortesia do coração; Silenciar é uma objeção, engolir as coisas produz necessariamente mau caráter - estraga inclusive o estômago."


NIETZCHE, Friederich. Ecce Homo; Como Alguém se Torna o que é. Trad. Paulo césar de souza. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p.29.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Sobre os Riscos


O que acontecia na verdade com Lóri é que, por alguma decisão tão profunda que os motivos lhe escapavam - ela havia por medo cortado a dor. Só com Ulisses viera aprender que não se podia cortar a dor - senão se sofreria o tempo todo. E ela havia cortado sem sequer ter outra coisa que em si substituísse a visão das coisas através da dor de existir, como antes. Sem a dor, ficara sem nada, perdida no seu próprio mundo e no alheio sem forma de contato.

LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

O início





XVIII

Esses inquietos ventos andarilhos

Passam e dizem: "Vamos caminhar.

Nós conhecemos misteriosos trilhos,

Bosques antigos onde é bom cismar"


E há tantas viegens a sonhar idílios!"

E tu não viste sob a paz lunar,

Beijar os seus entrefechados cílios

E as dolorosas bocas a ofegar..."


Os ventos vêm e batem-me à janela:

"A tua vida, que fizeste dela?"

E chega a morte: "Anda! Vem dormir:


Faz tanto frio... E é tão macia a cama..."

Mas toda a longa noite hei de ouvir

A inquieta voz dos ventos que me chama!...


QUINTANA, Mário. A rua dos cataventos.